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quinta-feira, 13 de maio de 2010

Entrevista com o escritor, produtor e desenhista Lacarmélio Alfêo de Araújo.

O criador do Celton, herói das histórias em quadrinhos, conta detalhes da sua trajetória.
Caroline Lopes.
Lacarmélio Alfêo de Araújo é conhecido pelos belo-horizontinos como Celton, o personagem das revistas em quadrinhos que produz. Nascido em 1959, na cidade de Inhapim, interior de Minas Gerais, desde criança já se interessava por histórias em quadrinhos. Suas revistas preferidas na infância eram as de Tarzan, Marvel e capitão America. Como a mãe só presenteava o escritor com histórias do Walt Disney, ele lia escondido as revistinhas do irmão e amigos. A paixão pelo desenho apareceu bem cedo na vida de Lacarmélio, ele tinha apenas 13 anos quando veio para Belo Horizonte com sua família, foi quando começou a idéia de produzir e vender suas histórias. Hoje, Celton vive nas grandes avenidas da capital mineira vendendo suas revistas em quadrinhos a apenas dois reais, e é desta forma, que ele ganha todo o seu sustento e de sua família.

Carol- Quando surgiu a vontade de produzir suas próprias revistas em quadrinhos?
Lacarmélio- Quando eu tive idade pra viajar sozinho. Na década de 70, eu comecei a ir atrás de editoras no Rio de Janeiro e em São Paulo pra tentar a publicação das revistinhas, mas não deu certo. Como isso era algo que eu queria muito, então pedi pra minha mãe fazer um empréstimo no banco pra eu mesmo conseguir bancar a publicação. A minha mãe fez o empréstimo, e foi exatamente em 1985 que publiquei minha primeira revista, detalhe, ela não vendeu nada.

Carol- Quando o Celton nasceu?
Lacarmélio - Na década de 70. Quando eu criava histórias em quadrinhos na minha infância, eu criei o Celton, ele era um super herói da mesma linhagem dos personagens das revistas que eu gostava de ler quando era criança.

Carol- Porque o nome Celton?
Lacarmélio- Quando eu criei o Celton, eu não queria por o nome dele de homem e algum bicho, igual os super heróis, sabe? Eu queria um nome fácil de falar, eu queria um super herói com um nome como se fosse um oi, olá, que fosse fácil de assimilar. Eu queria um herói diferente, um cara tranqüilo, na dele. O Celton está cada vez mais simples, ele tem uma super força e corre em alta velocidade, mas ele não tem identidade secreta. Ele tem uma oficina mecânica, onde ele conserta de tudo. Normalmente o brilho da história não fica em cima do Celton, mas dos personagens que tem a ver com o roteiro, o Celton é como um apresentador de televisão.

Carol- Quando você teve a idéia de vender as revistas nos sinais de trânsito?
Lacarmélio- Tive a idéia de vender as revistas na rua para pagar o empréstimo que minha mãe tinha feito. Primeiro, comecei a vender em barzinhos, porta de faculdade e como não estava dando muito certo, partir para os sinais.

Carol- E de onde surgiu toda essa sua experiência para vendas na rua?
Lacarmélio- A partir dos meu 13 anos eu já vendia coisas na rua. Vendia loteria, picolé, doce, também fui engraxate, ou seja, eu tenho uma experiência muito rica de rua.

Carol- Em sua opinião, qual foi o motivo para que as vendas das revistinhas crescessem tanto?
Lacarmélio- É que eu já não estava mais escrevendo o que eu tinha influência, eu comecei a sacar o que as pessoas gostavam de ler. Eu escrevo o roteiro hoje, depois gasto muito mais tempo pra adaptar o roteiro pra uma linguagem simples e popular. Eu escrevia muito pra mim, hoje eu escrevo pro leitor.

Carol- Qual é a tiragem das revistas?
Lacarmélio- Quando comecei, a primeira tiragem foram cinco mil. Hoje são 20 mil revistas por edição, e eu tenho que vender as 20 mil. Tudo o que você está vendo aqui em casa, esse estúdio aqui, é tudo dinheiro retirado da revista. Inclusive o cenário das histórias que eu escrevo, são as ruas de Belo Horizonte, isso foi muito importante para que as vendas aumentassem.

Carol- Qual foi a revista mais rápida que você produziu? E mais demorada?
Lacarmélio- Foi em dois meses a mais rápida, a mais demorada foi um ano. Quando eu faço o roteiro é uma coisa, quando eu parto pra produção, eu começo a ver se vai dar certo. A mais demorada teve uma aventura em duas partes, a primeira parte foi ‘’O Fantasma de ouro preto’’ e a segunda parte ‘’ O apocalipse de Belo Horizonte’’, é uma história de um fantasma que sai de Ouro Preto e vem pra Belo Horizonte tomar o título de capital de Minas Gerais. Ai, eu vou vendendo elas até a seguinte ficar pronta.

Carol- Qual a revistinha campeã de vendas?
Lacarmélio- ‘’O combate da sogra com o capeta’’, essa revista vendeu as 20 mil tiragens indiciais e não parava de vender, cheguei a 45 mil tiragens. Depois de dois anos que tinha escrito o roteiro, lancei a história no começo do ano passado. Eu fiz também ‘’O combate do galo com a raposa’’, mais ainda não vendeu como a sogra com o capeta. A próxima vai ser ‘’ o taxista e a passageira’’. Olha só outro titulo que está na minha cabeça, ‘’o marido, a esposa, a Amante e o Ricardão’’.


Carol- E da onde você tira as histórias escreve?
Lacarmélio- Na rua mesmo. Primeiro, eu lancei ‘’A sogra maldita’’, e foi a partir de uma observação no trânsito, quando eu estava vendendo a revista no sinal, que criei o roteiro do combate da sogra com o capeta. Eu estava parado vendendo a revista no sinal fechado, e tinha dentro de um carro parado na rua a sogra sentada no banco de trás e o casal na frente, e a sogra brigando com a nora, maior discussão. Então eu fiquei pensando, nossa que bacana ai virou história, ela vende legal, porém muita sogra começou a falar mal de mim na rua. Na revista tem meu telefone e elas Ligavam pra minha casa me xingando. Pensei né, vou lançar uma revista pra essas sogras e vou conquistá-las. Lancei ‘’A sogra maravilhosa’’, adivinha? Tive problema de grana, a sogra maravilhosa não vendeu nada.

Carol- Você já vendeu as revistas em outro estado?
Lacarmélio- Sim, em são Paulo. A partir de agora to ligado em assuntos mais nacionais pra poder vender aqui e lá, sem ter que produzir uma revista especifica pra cada estado. Mas o cenário das revistas continua sendo de BH. A próxima vez que eu for vender em São Paulo, eu vou produzir uma revista com cenas de são Paulo. Eu tiro fotos pra conhecer a cidade, tiro muita foto, e ai desenho. Eu trabalho o tempo todo, onde tem trânsito tem o Celton.


Carol- A única forma de divulgação das suas revistas em quadrinhos são as ruas, eu ouvir falar de pichações em muros sobre suas obras, é verdade?
Lacarmélio- É isso foi 1981. Comecei a pixar as paredes das casas na rua, eu escrevia assim, ’’ leia celton, e embaixo, MAGNIFICO’’. Olha, a revista ficou bem conhecida naquele período viu? Mas depois eu fui procurado por muita gente e tive que pintar os muros de novo, e eu pintei muitos muros. Pintava o muro todinho.

Carol- Você deve passar por algumas situações inusitadas no trânsito, conta pra gente?
Lacarmélio- Duas que eu to lembrando aqui. Quando eu tava vendendo ‘’O capeta do vilarinho’’, eu estava carregando uma placa assim: Neste número, o capeta do vilarinho, e no período que eu estava vendendo a revista, apareceu um cara que arrancou a bíblia do bolso e começou a esfregar na placa, e gritando assim: Jesus vai amarrar esse bicho, Jesus vai amarrar esse bicho. Depois teve outra, em frente o Minas Shopping, antes da obra, um casal mais velho passou de carro, quando eles viram o nome capeta na placa, o cara começou a jogar pedra e falou a mesma coisa do outro, Jesus vai amarrar esse bicho, e a mulher dele ficava fazendo sinal da cruz toda hora, sem parar. Ontem mesmo, uma senhora da janela do ônibus gritou: Sai daí sai daí.

Carol- Qual a história que você teve mais prazer em escrever?
Lacarmélio- ‘’O apocalipse de BH’’, porque gosto muito de história e geografia e a revista exigiu pesquisa, deu muito trabalho. Também gostei de escrever ‘’o capeta do vilarinho’’, porque eu conseguir criar um roteiro em cima da lenda sem desvendá-la. A lenda você tem que deixar continuar, ‘’a loira do Bonfim ‘’ também gostei de escrever e vou lançar novas edições com ela.

Carol- Você já ganhou algum prêmio?
Lacarmélio- Já, um do Instituto dos Arquitetos do Brasil, por causa do cenário de Belo Horizonte na minha revista. Já ganhei um prêmio da Prefeitura, e alguns outros prêmios por ai. Muito bom.

Carol- Você acha que tem o reconhecimento que merece?
Lacarmélio- Eu sou um cara prático, pra mim, o reconhecimento aparece com a venda da revista por que eu preciso dela pra viver. Quando o Jô Soares me convidou para ir até o programa dele, eu fui lá duas vezes, você sabe né? Muita mídia de BH, que nem me via começou a me ver. A minha obra começou a sair nessas revistas de critica de literatura sabe? E antes era abaixo da critica, (risos), e eu considero isso um reconhecimento. Agora o Mauricio kubrusly, do Fantástico, esteve aqui em casa e gravou também. E eu já apareci em alguns programas locais de São Paulo.

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